O ministro Luís Felipe Salomão, relator do recurso, afirmou que a advocacia é função essencial à administração da Justiça, conforme a Constituição. Assim, não se pode considerar que suas prerrogativas sejam um privilégio corporativo; na verdade, são uma proteção ao cliente, que confia documentos e segredos ao seu procurador.
Rumo
No caso dos autos, após não serem localizados bens para penhora, o juízo determinou que o advogado informasse o endereço do cliente. Ele atendeu à determinação, mas o executado não foi encontrado. Diante disso, o juízo ordenou, a pedido do credor, que o advogado apresentasse o contrato de serviços. Contra essa decisão, então, o advogado impetrou mandado de segurança, alegando que ela feria seu direito líquido e certo à inviolabilidade dos documentos relacionados ao exercício da profissão, garantida pelo artigo 133 da Constituição Federal. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) indeferiu o pedido sob o entendimento de que, por se tratar de decisão interlocutória, deveria ser combatida por agravo de instrumento, e não por mandado de segurança.
Em seu voto, o ministro Salomão registrou que a doutrina e a jurisprudência majoritárias admitem que o mandado de segurança seja impetrado contra ato judicial em situações excepcionais, como na hipótese em que um terceiro é prejudicado pela decisão. Para o magistrado, como o advogado não é parte da demanda principal, foi legítima a impetração do mandado. Ela toma por base a Súmula 202 do STJ, a qual dispõe que “a impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso”.
Confiança
Ao deferir a segurança e cassar a decisão do juízo executante, o relator disse que as prerrogativas do advogado não são absolutas. Elas se limitam ao exercício regular da atividade profissional e não se prestam a encobrir a prática de condutas juridicamente censuradas. Para ele, o sigilo profissional tem como referência o caráter personalíssimo que reveste a relação entre advogado e cliente, baseada na confiança recíproca.
Salomão lembrou que o Supremo Tribunal Federal, em diversos precedentes, reiterou a necessidade de que seja assegurada a inviolabilidade do advogado. Ele também apontou que a garantia do sigilo profissional é respaldada pelo artigo 5º, inciso XIV, da Constituição Federal, pelo artigo 7º, inciso II, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia), pelo artigo 154 do Código Penal e pelo artigo 207 do Código de Processo Penal.
Vontade
“Sobre a exigência judicial de apresentação de contrato de prestação de serviços entre advogados e cliente, a comissão e a seccional têm posição contrária em todas as situações onde a apresentação não é voluntária. Exatamente considerando o sigilo profissional, garantido pelo artigo 5º, XIV da Constituição Federal e reafirmado pelo Estatuto da Advocacia e da OAB, em especial em seu artigo 7o, II, que trata da inviolabilidade do escritório, protegendo a relação de confiança entre advogado e cliente”, comenta a advogada Débora Ling, presidente da Comissão de Defesa dos Honorários Advocatícios da OAB Paraná.
Em relação aos direitos dos advogados contratados, diz ela, importa mencionar o fator precípuo de qualquer contrato, qual seja, a vontade das partes. “Assim, dentro dos limites impostos pelo Código de Ética e Disciplina, especialmente nos artigos 48, 49 e 50, bem como a observância da Tabela de Honorários da Seccional e de nosso Estatuto, o contrato é livre entre as partes e deve seguir as regras gerais do capítulo das obrigações do Código Civil, não se sujeitando ao Judiciário, a não ser para interpretá-lo, executá-lo ou analisar a sua legalidade e licitude”, observa.
Débora explica que são inúmeros os casos em que se determina a apresentação do contrato de honorários no momento do cumprimento de sentença, em especial perante a Justiça do Trabalho, e não raros os que – sem sequer pedido de qualquer das partes – os juízes do trabalho entendem não devidos os valores contratados e determinam sua diminuição. Para ela, não cabe ao Judiciário emitir qualquer opinião, quanto menos limitar o valor do serviço prestado, sua relevância ou qualquer outra questão que não se cinja à legalidade e licitude, quanto menos em processos cuja matéria não é a relação contratual entre advogado e cliente.
“A decisão proferida no RMS 67105, em que pese tratar exclusivamente de questões voltadas ao sigilo dos dados do cliente, fortalece o posicionamento da OAB quanto a não obrigatoriedade de juntada do contrato de prestação de serviço. Há casos em que o advogado faz juntar seu contrato com a finalidade de reservar seus honorários, esta é uma prerrogativa prevista no artigo 22, parágrafo 4º da Lei 8.906/94, em que é possível deduzir os honorários contratuais de créditos judiciais, desde que antes da expedição de alvará ou precatório”, completa.