A presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) e da Comissão de Arbitragem da OAB Paraná, Inaiá Nogueira Queiroz Botelho, presidiu a mesa em que as questões tributárias foram abordadas, na tarde desta quarta-feira (12/8), na Semana da Advocacia Paranaense. Promovida pela OAB Paraná, por meio da Escola Superior de Advocacia (ESA), e também pela Caixa de Assistência dos Advogados do Paraná (CAA-PR), a mesa integrou a programação da Semana da Advocacia Paranaense.
Betina Grupenmacher, professora de direito tributário da Universidade Federal do Paraná (UFPR), abriu os debates abordando a criminalização do não recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). A tese de que “o contribuinte que, de forma contumaz, e com dolo de apropriação, deixa de recolher ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do artigo 2, inciso 2, da Lei 8.137” foi acatada, por maioria, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no final de 2019.
Na avaliação da jurista, “ao criminalizar o empresário que declara o ICMS e não paga o respectivo tributo, o STF criou um novo tipo penal e portanto esse é mais um caso de ativismo judicial, o que incrementa o estado de insegurança jurídica que estamos vivendo”. Ao apontar as incoerências da decisão relativas ao dolo da apropriação e à contumácia, Betina frisou que a questão exigirá cautela dos juízes diante da crise em que o país se encontra. O entendimento da tributarista foi endossado pelos outros painelistas, que concordaram com a leitura de que a decisão criou um tipo penal híbrido.
Política Tributária
A ex-secretária da Fazenda ex-Procuradora Geral do Estado do Paraná, Jozélia Nogueira, discorreu sobre o papel da política tributária para a recuperação da economia. “A reforma tributária exige que pensemos na redução das desigualdades sociais. De nada adianta pensar os tributos que cobraremos do empresário se ele não tiver condições de se sustentar no mercado. A atual discussão não está se debruçando naquilo que deveria”, defendeu.
Com base nos estudos da economista italiana Mariana Mazzucato, Jozélia sustentou que é preciso distribuir riqueza. “Nada melhor do que a tributação, porque é isso vai gerar justiça fiscal e social”, disse. Para ela, diante da crise que se anuncia no período pós-pandemia – que segundo especialistas será uma das piores desde a 2º Guerra Mundial – é essencial priorizar a criação e manutenção de empregos, a redução das desigualdades e o fomento às empresas.
“A crise que está por vir é tida como uma tragédia anunciada aos governos. Diante disso será fundamental repensar o capitalismo, repensar para que servem os governos. Todos os países que no pós guerra se tornaram neoliberais já voltaram para o estado de bem estar social para atender o povo. O neoliberalismo que o Brasil abraça hoje prega uma ideia contrária, a de que o mercado é capaz de se auto regular. É muito importante que exista um Estado forte, regulador, porque o mercado não consegue se auto regular. É impossível que o mercado dê conta das necessidades de todas as pessoas”, sustentou.
“O mercado está a serviço da classe alta. Nesse contexto é fundamental acabar com a desigualdade e a acumulação, que faz com que tenhamos uma classe muito rica e pequena, e classes muito distantes disso. É preciso distribuir a riqueza e nada melhor para isso do que a tributação. As estatais devem ser mantidas, uma vez que conseguem prestar serviços aos cidadãos que não têm condições de pagar por eles. As estatais são patrimônio público”, argumentou. “Se o povo não tiver trabalho e renda, como vai viver? Pagar serviços públicos? É preciso que a economia continue sendo alimentada. É uma cadeia que funciona se todas as engrenagens estiverem girando”, pontuou.
Reforma
A reforma tributária em tramitação no Congresso e seus reflexos para a advocacia foram o tema da apresentação do presidente da Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB, Eduardo Maneira, que leciona na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Talvez por conta da crise o Poder Legislativo venha com a reforma tributária e aprove a PEC 45/2019 com alguns ajustes. Temos uma agenda que vai se definir nos próximos 30 dias”, aposta o advogado.
Para Maneira, o cenário de incertezas e inseguranças não permite afirmar com precisão se a reforma avançará. “É certo que talvez pela crise que estamos vivendo – de liderança, política, financeira e sanitária – esse vácuo de coordenação política possa fazer com que a reforma tributária seja conduzida pelo Legislativo com sucesso, porque não existe vazio de poder, alguém ocupa. E pode ser que o Legislativo ocupe esse lugar e aprove a reforma. Há clara disposição política do presidente da Câmara de deixar a reforma como seu legado”, ponderou.
“Outra questão, que interessa a nós, advogados, é que certamente haverá aumento da carga para o prestador de serviço. Há uma vontade deliberada em qualquer projeto de lei que venha a ser aprovado de aumentar a tributação à advocacia. Acredito que há uma clara disposição de aumento da carga tributária para os serviços em geral, seja pela PEC 110/2019 (Senado), pela PEC 45/2019 (Câmara) ou pela que criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS). A agenda vai se definir nos próximos dias, depois podemos fazer outro debate”, afirmou Maneira.
Transação tributária
O presidente da Comissão de Direito Tributário da seccional, Fabio Artigas Grillo, abordou a importância e as características gerais da transação tributária, além das condições e limites do ponto de vista de base normativa. O tributarista também pontuou transações específicas que derivam da lei 13.988, de dia 14 de abril 2020. “A transação tributária vem como um instrumento para dar efetividade à Justiça Fiscal. É fundamental a participação dos advogados nesse processo”, esclareceu.
Grillo explicou que a alternativa surgiu como forma de extinção de conflitos tributários. “Os números são absurdos, não só os que a Fazenda Nacional nos fornece – os números mais recentes indicam R$2,5 trilhões de dívida ativa, sendo que desse volume R$ 600 bilhões são efetivamente cobráveis. O Justiça em Números do CNJ mostra na edição de 2019 taxas de congestionamentos em função das execuções fiscais que chegam a 90%, indicando que pelo menos 73% das execuções que tramitam em todo Poder Judiciário nacional são de natureza fiscal”, disse.
“Isso precisava ser enfrentado e, de maneira feliz na essência, mas infeliz na forma, o governo editou no ano passado a Medida Provisória 899, a chamada MP do contribuinte legal, mas que na verdade veio instituir essa modalidade em termos concretos, na medida em que já tinha a previsão específica no nosso sistema. A importância dessa alternativa trazida de maneira afoita como MP resultou numa medida providencial em função do estado de calamidade pública da pandemia, e tivemos recentemente a conversão dessa medida da lei 13.988, de dia 14 de abril 2020”, afirmou.