As questões recursais foram tema de um dos painéis do III Congresso de Processo Civil, que acontece até amanhã (quarta-feira), no Teatro Guaíra, numa promoção da Escola Superior de Advocacia da OAB Paraná. Com a participação do professor Sandro Kozikoski como moderador, o tema foi debatido pelos processualistas William Santos Ferreira (PUC-SP), Rita Vasconcelos (PUC-SP), Ronaldo Cramer (PUC-RJ) e Fabiano Carvalho (FAAP).
Um dos pontos mais controvertidos em relação aos recursos, no novo Código de Processo Civil, diz respeito ao agravo de instrumento. O assunto foi amplamente abordado durante o congresso. Pelo CPC 2015, nem todas as decisões interlocutórias admitem recurso de agravo de instrumento, apenas as hipóteses relacionadas no artigo 2015, o que tem criado dificuldades para os advogados.
Para o advogado William Santos Ferreira, esse é um dos problemas mais graves. “Aparentemente o artigo 2015 tem uma pretensão de ser um rol taxativo, que só cabe naquelas hipóteses. Ocorre que existem inúmeros casos em que isso gera a inutilidade de um recurso futuro, que seria a recorribilidade de uma decisão interlocutória ao final do processo pelo recurso de apelação”, diz. Segundo ele, existem várias situações em que a recorribilidade deve imediata ou será inútil ao final do processo. “O que parece estranho é endereçar recorribilidade para inutilidade, ou seja, se é recurso, é para ser útil; se não é útil, não é recurso. Então, há uma contradição nessa situação”, sustenta. O que Ferreira propõe é que se há uma recorribilidade e a apelação é inútil, tem que caber o agravo de instrumento para decisões interlocutórias, basicamente pelo requisito da utilidade.
William Ferreira observa que os tribunais estão fechados às hipóteses variáveis e muitos dos recursos estão sendo rechaçados dizendo que não é cabível porque não está no rol do artigo 2015. “Alguns estão concedendo excepcionalmente o mandado de segurança ou muito residualmente agravos de instrumentos. A minha opinião é que a jurisprudência vai constatar esse problema e o rol será ampliado pela necessidade prática da solução de algumas questões.”
Ponto positivo – Para Rita Vasconcelos, a questão dos agravos de instrumento atrapalha os advogados, mas de todo modo é positivo saber que aquelas decisões, ainda que não comportem agravo de instrumento, não precluem. “Numa outra oportunidade, lá no final do processo, a parte vai poder trazer essas questões em sede de apelação. De alguma forma, o legislador tirou com uma mão e deu com a outra. É um ponto que ajuda o andamento mais célere do processo”, avalia.
Outro ponto importante destacado por Rita Vasconcelos é a possibilidade dos vícios formais dos recursos serem corrigidos. “É importante porque privilegia a questão do julgamento em si. Muitas vezes o órgão judiciário nem chega a julgar a questão em razão de um vício formal. Agora, como o relator pode oportunizar à parte a correção, isso privilegia o acesso à justiça, uma vez que a questão de direito que a parte levou ao judiciário vai ser examinada. Isso é um ponto muito positivo”, afirma.
Inusitado – Fabiano Carvalho também aponta o rol taxativo das hipóteses que comportam agravo de instrumento um dos principais problemas na parte de recursos do novo código. Ele cita como exemplo uma situação em que o juiz dá uma decisão que manda suspender o processo. Essa decisão, pelo artigo 2015, não é objeto de recurso imediatamente. O processo fica suspenso, muitas vezes indevidamente, e não há como destrancar, gerando uma situação inusitada. “A única saída é o mandado de segurança, que muitas vezes resolve, mas o tribunal é refratário em aceitar esse mecanismo porque na verdade ele vira um sucedâneo recursal – um substituto do recurso. Isso também não é bom. A gente volta para o sistema anterior com outro nome – ao invés do agravo de instrumento, o mandado de segurança”, argumenta.
Outro ponto que chama atenção no novo código, na opinião de Fabiano Carvalho, é a extinção dos embargos infringentes, cabível nas hipóteses de divergência no julgamento colegiado. “Como esse recurso sempre foi alvo de crítica, desde o sistema anterior ao código de 73, resolveram extinguir. Inicialmente, a proposta era simplesmente a extinção, sem nada no seu lugar. Posteriormente, por iniciativa do Instituto Brasileiro de Direito Processual, houve a inserção da técnica de complementação de julgamento colegiado – ou seja, quando o julgamento não é unânime chama-se mais julgadores para complementar o julgamento”, explica. Para Carvalho, a medida é boa, porque amplia o leque do contraditório, amplia a discussão, e de certa forma evita a divergência. “Agora, ele suscita algumas divergências no sentido de saber qual é amplitude do debate quando estendido o julgamento. Será que esse debate pode se estender também para questões que foram julgadas de forma unânime?”, questiona.
Quanto à possibilidade de correção dos vícios dos recursos, Carvalho explica que o dispositivo foi inserido justamente para que os tribunais julguem verdadeiramente o mérito. No entanto, ele observa que os tribunais continuam, por força do histórico da jurisprudência defensiva, inadmitindo recursos e falando que o artigo 932 se aplica a situações excepcionais. “É importante que o advogado se conscientize da sua responsabilidade perante o Poder Judiciário e faça valer o CPC, brigue pelo conhecimento do recurso, pela aplicação da jurisprudência ao caso. O advogado também tem uma responsabilidade em construir argumentos positivos, evitar discussões que não são próprias do processo a fim de prolongar o resultado”, diz.
Ao final, o moderador Sandro Kozikoski avaliou o debate. “Não tivemos convergências em todas as opiniões, o que é natural, mas é dessa forma que o público acaba tendo um melhor aproveitamento. Esperamos que com a pluralidade de visões aqui trazidas o público tenha como utilizar isso no seu cotidiano. Essa é a missão da ESA ao fomentar esses debates”, disse.