OAB Paraná realiza IV Encontro Estadual da Representatividade das Mulheres Negras nas Carreiras Jurídicas

A OAB Paraná realizou o IV Encontro Estadual da Representatividade das Mulheres Negras nas Carreiras Jurídicas. O evento ocorreu no Dia da Mulher Negra Latino-americana, Caribenha da Diáspora, faz parte do Julho das Pretas e visa contemplar de maneira ampla as dificuldades, peculiaridades e principalmente perspectiva de representatividade das mulheres negras nas carreiras jurídicas. A presidente da seccional, Marilena Winter, abriu os trabalhos e o diretor-tesoureiro, Luiz Fernando Pereira e a diretora da Jovem Advocacia, Fernanda Valério, também estiveram presentes.

“Esse encontro para nós de grande valor e de grande significado. Quero agradecer o trabalho de vocês e dizer que é uma honra muito grande para a OAB Paraná ser a anfitriã desse evento” disse a presidente da seccional. “Digo com bastante emoção e com bastante entusiasmo que, a cada ano que passa, essa representatividade está se consolidando. Ainda é muito pouco, ainda há muito a se construir e ainda há muito a se compreender. Queremos dar a voz e vez às pessoas que o conquistaram!”, disse Marilena.

O evento teve como palestrantes, a presidente da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal, Silvia Virginia Silva de Souza; a procuradora do município de Salvador, Lilian Oliveira, Azevedo de Almeida; a conselheira federal e presidente da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no brasil, Silvana de Oliveira Niemczewiski; e a juíza da Terceira Vara do Trabalho de São José dos Pinhais, Sandra Mara de Oliveira Dias. Houve ainda a participação especial da procuradora de Justiça do Ministério Público do Paraná, titular do 1º Grupo Criminal, Miriam de Freitas Santos.

Também participaram como debatedores presidentes de comissões da OAB Paraná: Anderson Farias Ferreira, da Verdade e da Escravização Negra; Cássio Prudente Vieira Leite, de Igualdade Racial; e Luiz Carlos Hauer, de Política sobre Drogas. O secretário da Comissão de Igualdade Racial, Alexsandro Ribeiro Martins, atuou como apresentador. A presidente da Comissão das Mulheres Advogadas, Emma Bueno, também esteve presente e foi representada na mesa pela secretária -adjunta da Comissão e jovem advogada negra, Nahomi Helena de Santana

Pereira ressaltou o trabalho das três comissões organizadoras do evento e parabenizou também a abordagem da organização, que incluiu a apresentação musical do grupo Samba das Pretas na abertura.

“Vemos mais pessoas negras e mulheres negras se destacando e isso motivo de muito felicidade. Por isso me sinto muito acolhida em nossa casa”, disse Fernanda.

A secretária-ajunta da CMA destacou a relação do tema com o nome da sala do Conselho Pleno, onde o evento foi realizado – Democracia. “O que estamos hoje a fazer é dar sentido a esta sala, estamos aqui a ouvir e a falar de democracia. Fico muito honrada em representar a comissão das mulheres advogadas em toda a sua diversidade, pluralidade e simbolismo”, disse Nahomi. Ela também ressaltou a importância do protagonismo de mulheres negras para as jovens. “Poder se ver representado é sim muito e muito importante”, concluiu.

“A pluralidade que se faz presente muito me orgulha em poder fazer parte. Este é somente o quarto evento sobre o assunto em mais de 90 anos da OAB. O que demonstra que temos muito a evoluir”, pontuou o presidente da Comissão de Igualdade Racial.

O presidente da Comissão da Verdade e da Escravização Negra falou sobre o papel dos homens em tal debate. “Temos que continuar colaborando, sendo solidários com as nossas colegas, nossas esposas e nossas filhas”, afirmou Ferreira, que Também ressaltou a dimensão nacional do evento.

Mulheres negras trazem reflexões sobre a realidade

Igualdade racial e gênero
A presidente da Comissão de Direitos Humanos do Conselho Federal trouxe alguns dados para reflexão sobre conexão entre paridade de gênero e igualdade racial. Silvia apontou que no poder Judiciário, 64% dos juízes são homens e 63% brancos. “O Judiciário é maciçamente masculino e branco”, sintetizou.

Silvia ressaltou ainda que as mulheres negras ainda protagonizam o que Sueli Carneiro chamou de matriarcado da miséria. Antes da pandemia, as mulheres negras eram 32% da população em situação de pobreza e hoje são 38%. O trabalho doméstico ainda é o que mais insere mulheres negras no mercado de trabalho e o que mais guarda relação com a escravidão, com menos garantias de direitos. “O que faz de mim e das mulheres estão sentadas a essa mesa exceção”, refletiu. “Não é possível pensar em igualdade de gênero sem pensar em igualdade racial.

Instituições
A juíza Sandra Mara de Oliveira Dias falou sobre o papel das instituições na busca da igualdade racial. Ela também trouxe os dados da realidade da inserção da população negra em diferentes profissões. Mulheres negras são somente 3% das doutoras docentes da pós-graduação no Brasil. Entre os médicos 17,6% são negros e entre os profissionais da saúde são Profissionais, 27,3%. Entre os professores chegam a 35%. Já no serviço doméstico a representatividade das pessoas negras chega 65%.

A magistrada falou do âmbito da Justiça do Trabalho do Paraná: há 31 desembargadores, 1 mulher negra; 96 juízes titulares dos quais 4 negros; 85 juízes substitutos, sendo 3 negros. “O símbolo da magistratura brasileira é homem e branco. O fato de ser juíza não livra do preconceito, a toga não me livra”, constatou a Sandra Mara. Ela também citou a criação do Comissão Permanente de Políticas Afirmativas de Valorização e Inclusão Racial e de Gênero no Âmbito da Justiça do Trabalho do Paraná para modificar esse cenário.

Legado
Silvana falou sobre o legado dos advogados pioneiros negros Pamphilo d'Assumpção e Enedina Alves Marques. “De onde viemos? Onde estamos? Onde queremos chegar?”, questionou. Ela também lembrou do Plano de Igualdade Racial, aprovado de forma pioneira na OAB Paraná “Foi um avanço, conseguimos aprovar por unanimidade nessa sala de Conselho Pleno e serve de exemplo no Sistema OAB e em Diversas outras instituições”, apontou a conselheira federal.

“Como o negro, o pardo chegou às universidades? Como a mulher negra chegou à advocacia? Como podemos chegar a cargos de gerência na advocacia?”, perguntou. “Podemos chegar, mas é preciso adotar medidas específicas para isso”, disse Silvana, que também ressaltou a importância da união entre as raças. “Ninguém aqui está falando de apartheid. Os negros não querem caminhar sozinhos, queremos união. Sempre amor, nunca ódio.


Perspectivas para a busca da igualdade racial
A presidente em exercício da Associação Nacional dos Procuradores Municipais (ANPM), Lilian Azevedo, trouxe uma reflexão sobre as perspectivas para a busca da igualdade racial a partir da poesia “Vozes-Mulheres”, de Conceição Evaristo, que narra a trajetória de mulheres negras em nosso país. "A poesia de Conceição Evaristo resume uma caminhada ancestral, que traz a história de dores que formou nosso país. Traz a ideia de uma população negra que era composta de reis, rainhas, médicos, engenheiros, donas de casa, jornalistas, de um futuro próspero em um continente africano, que foram sequestrados, vilipendiados e trazidos para o solo brasileiro”, disse.

“De geração em geração, ela passa pela avó, pela mãe, pela filha - mas não só a minha filha, mas os filhos e filhas do nosso solo. Somos o sonho de liberdade de um povo sofrido que se reergueu e continua se reerguendo. Como foi dito: eu me levanto”, afirmou.

A procuradora municipal lembrou que o racismo afeta a saúde, a educação, a imagem e a subjetividade de indivíduos, por isso deve ser combatido a partir de uma visão sistêmica, que parta da reflexão de que a subalternidade da mulher negra e do homem negro está no imaginário social. “Não vamos cair no ledo engano de achar que esta é uma pauta segmentária, porque neste podemos ter uma visão sistêmica de quantas dores cabem nesta encruzilhada. Cabe a dor da violência contra a mulher, a dor da pessoa com deficiência, a dor do sexismo, a dor da homofobia”, disse.

Ela defendeu ainda a importância de ações práticas voltadas ao tema, destacando que a ANPM lançou a premiação Esperança Garcia, que visa divulgar projetos de sucesso na adoção de boas práticas relativas à promoção da igualdade racial nas instituições municipais que envolvam a participação das Procuradorias.