A OAB Paraná inaugurou nesta segunda-feira (12/9) o seminário “Brasil 200 anos de conquistas e retrocessos: independência ou morte de direitos?”. O painel de abertura foi presidido pela advogada e professora Regina Bacellar. “Em 1822 foi feita por Dom Pedro uma promessa de um país mais justo e igualitário. Uma promessa que até hoje não se cumpriu. Ou não teríamos escravidão camuflada, dificuldade de acesso à justiça, violência, corrupção. Este evento busca refletir sobre os direitos, os avanços, os retrocessos e o que precisa ser feito para que a promessa seja cumprida”, disse Regina Bacellar antes de anunciar a execução do Hino à Independência.
A primeira conferência do painel foi proferida pela presidente da OAB Paraná, Marilena Winter, que discorreu sobre o percurso da OAB na história do Brasil. “Instalada a República foram diversos os projetos legislativos frustrados até que André Faria Pereira obtivesse sucesso no objetivo de inserir em um decreto de 1930 um artigo prevendo a criação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Levi Carneiro foi o primeiro presidente da instituição. Na OAB Paraná, o primeiro presidente foi Pamphilo Velloso d´Assumpção, que também fundou o Instituto dos Advogados do Paraná (IAP) e da Universidade Federal do Paraná (UFPR). A OAB, ao longo dessas 9 décadas, buscou exercer papel fundamental na vida dos advogados, mas também no cenário social e político”, recordou.
Relevância
Em sua exposição, Marilena Winter pontuou ainda que o Brasil conta com o maior contingente de advogados do mundo com 1,3 milhão de profissionais, sendo 80 mil no Paraná. “Temos uma instituição cuja presença na sociedade é bastante relevante. A posição que a OAB assume é bastante relevante justamente por representar a parcela não estatal no sistema de justiça. A OAB chega aos 90 anos com um bonito papel na edificação do Estado de Direito, pois nunca deixou de se posicionar ao lado dos direitos sociais, das liberdades, da democracia, mesmo nos momentos mais sombrios da história do Brasil. Nos anos 60 não nos eximimos de apoiar colegas que foram indevidamente presos. Há relatos de advogados indo buscar colegas nos quartéis, livrando-os das prisões arbitrárias nos porões da ditadura”, frisou.
O protagonismo da OAB na redemocratização no fim dos anos 70 também foi apontado pela palestrante. “Em 1976 a OAB Paraná se manifestou sobre a necessidade de resgate dos Habeas Corpus e das garantias individuais. Como consequência, em 1978, a OAB Nacional promoveu aqui em Curitiba a célebre VII Conferência Nacional dos Advogados, marcando o início do movimento pela anistia e pela restauração do Estado de Direito. Realizada sob condução de Raymundo Faoro, a conferência teve o Estado de Direito como tema”, citou. Marilena recordou palavras proferidas à época pelo então presidente da OAB Paraná, Eduardo Rocha Virmond,: “Não é o Estado de Direito somente a expressão da vontade de alguém ou de alguns, por simples espírito de condescendência. O Estado de Direito é uma exigência da história em progressão, é antes de tudo a liberdade de cada um e a certeza e a confiança da possibilidade de pensar e de realizar”.
A presidente destacou que a instituição é plural, por isso deve se manter independente a apolítica, fazendo sempre a defesa do Estado de Direito; não de governos ou de sujeitos governantes. “Faço essa introdução para dizer que reafirmamos cotidianamente nosso compromisso com a advocacia, a sociedade e a manutenção do Estado de Direito com vistas à perenidade da paz social. Nossa arma é a palavra, nossa luta é pacifista. É importante ter sempre em mente o papel fundamental de nossa instituição, como defensora da advocacia e porta-voz da cidadania”, afirmou.
Sem linearidade
Ainda no painel inaugural, o reitor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Ricardo Marcelo Fonseca proferiu a conferência “Os 200 anos do Brasil e o Direito brasileiro: uma história controvertida e não linear”.
“Vamos ser francos: não há nada de muito heroico em nosso processo de independência, ao contrário do que ocorreu na América Espanhola. Aqui tivemos uma negociação que manteve o poder na mesma dinastia. Até o famoso quadro do Pedro Américo é, como aponta a historiadora, Lilia Schwartz, pouco autêntico. Não se andava a cavalo, mas de burro. Não havia colinas na região do Ipiranga. Também não se vê escravos no quadro, que aliás foi pintado décadas depois da declaração de independência, em 1888. Então, o que, afinal de contas, estamos comemorando?”, questionou.
Tomando a linha de pensamento do filósofo Walter Benjamin, o reitor da UFPR ressaltou que não existe linearidade ou progresso na história. “Não existe acúmulo. A democracia e as liberdades são ganhas e perdidas periodicamente. Isso é verdadeiro na Europa, vide o que ocorreu no nazi-fascismo. Imaginem, então, no Brasil, onde as instituições são tão mais frágeis”, comparou. O palestrante afirmou que aquilo se viu em 1822 foi um ato pela continuidade expresso pela Constituição de 1824. Como exemplo, ele citou a vigência da Lei da Boa Razão, de 1769 que, na prática significava dizer que tudo o que o jurista achasse que tinha ar de boa razão prevaleceria. “Continuidade sempre foi a nossa marca. Duas características que valem para o século 19 e 20: a primeira é uma convivência que sempre se deu entre o arcaico e o moderno. Outra característica central desses 200 anos é o divórcio entre o mundo real e o mundo jurídico.
“A mágica do direito liberal é afirmar que todos têm direito à propriedade. Mas o que significa isso? O direito liberal pensado no século XIX viabiliza a profunda desigualdade material em meio a uma arquitetura formal que tudo aceita. Esse é o nosso processo e ele leva a posições dúbias”, disse o reitor, relembrando como exemplo o processo de cassação de José Rodrigues Vieira Netto em processo administrativo da UFPR. “A universidade naqueles tempos jogou um jogo dúbio e a OAB também teve momentos assim. Mas a questão é avaliar os avanços e retrocessos para poder compreendê-los”, ponderou Fonseca.
Qual democracia?
“O ataque mais severo à liberdade e à democracia ocorre justamente em nome desses pilares — e com linguagem jurídica. O front jurídico, ao menos nesse momento histórico em que vivemos, é o mais valioso. Ninguém vai dizer que é contra a democracia ou a liberdade. A questão é: qual democracia e qual liberdade? É nesse debate que temos de entrar, pois nossa liberdade e nossa democracia estão em perigo de fato”, advertiu ao fim da exposição.
A mesa do painel de abertura foi também composta por Marília Pedroso Xavier, coordenadora Geral da Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB Paraná e Rafaela Polydoro Küster, coordenadora-geral das comissões da seccional. A programação prossegue até o dia 13 de setembro, com extensa agenda de debates. Confira abaixo os demais painéis da programação:
SEGUNDA-FEIRA, 12/9
PAINEL 1: (10h) (Des) igualdade racial no Brasil ao longo dos 200 anos de história da independência
a) Comissões organizadoras: COMISSÃO DO PACTO GLOBAL, COMISSÃO DA IGUALDADE RACIAL, COMISSÃO DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS, COMISSÃO DA VERDADE E DA ESCRAVIDÃO NEGRA
b) Mediação: Maria da Gloria Colucci (Professora Adjunta aposentada da UFPR. Professora Titular de Teoria do Direito (Unicuritiba) (1978-2021). Membro da Comissão do Pacto Global (OAB-PR).
Sandro Luiz Britto Sprenger (Vice-Presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB/PR(gestão 2019/2021); Conselheiro do COMPER – Conselho Municipal de Política Étnico Racial de Curitiba. Advogado)
c) Palestrantes:
Tema: O contexto social da população negra no Brasil – André Nunes (Advogado. Mestre em Direitos humanos pela UFPR. Conselheiro Estadual da OAB/PR (2022/2024)
Tema: Igualdade Racial no sistema de Justiça/OAB – Rita Cristina de Oliveira (Defensora Pública Federal. Coordenadora do Grupo de Políticas Etnorraciais da Defensoria Pública da União. Mestranda em Direitos Humanos e Democracia pela UFPR)
Tema: Perspectivas para uma advocacia mais consciente, inclusiva e plural – Laola Marinho de Oliveira (Pós-graduada em Direito das Famílias e Sucessões pela ABDCONST. Conselheira Estadual da OAB/PR. Membro da Comissão de Igualdade Racial, de Direito das Famílias e da Mulheres Advogadas da OAB-PR)
PAINEL 2 (13h30): Cidades e Gestão Pública: o percurso da segregação socioespacial e da administração pública no Brasil: 13h30
a)Comissões organizadoras: COMISSÃO DE DIREITO À CIDADE, COMISSÃO DE GESTÃO PÚBLICA E CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO
b) Mediação: Moacir Ribeiro de Carvalho Junior (Membro da Comissão de Direito à Cidade).
c) Palestrantes: Mariane Yuri Shiohara Lübke (Doutora e mestre em direito Econômico e desenvolvimento pela PUCPR. MBA em Gerenciamento da Administração Pública Municipal pelo IBPEX. Presidente da comissão de gestão pública e controle da administração da OAB-PR).
Daniele Regina Pontes (Professora do Departamento de Geomática da Universidade Federal do Paraná e do Programa de Pós-Graduação em Planejamento Urbano (PPU). Graduada, mestre e doutora em Direito).
PAINEL 3 (15h30): Infraestrutura no Brasil: entre o público e privado
a) Comissões organizadoras: Comissão de Direito Ambiental, Comissão de Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável
b) Mediação: Rafael Filippin (Membro da Comissão de Direito Ambiental)
c) Palestrantes:
Tema: Panorama histórico e perspectivas das mudanças climáticas no Brasil – Aritha Suit Ruck Rocha (Pós graduada em direito empresarial e direito Ambiental. Atuante na área do agronegócio desde 1997)
Tema: A judicialização da política pública de saneamento básico – Fernando Massardo (Advogado, especialista em direito do saneamento, mestre em meio ambiente urbano e industrial, doutorando em meio ambiente e desenvolvimento)
Tema: Infraestrutura entre o Público e o Privado – Márcia Fernandes Bezerra (Advogada com atuação nas áreas de Direito Administrativo, Regulatório e da Infraestrutura. Doutora em Estado, Economia e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Membro da Comissão de Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável da OAB/PR).
Tema: Perspectivas da Infraestrutura no Brasil – Heroldes Bahr Neto (Advogado. Mestrando no Unibrasil e Presidente da Comissão de Infraestrutura e Desenvolvimento Sustentável da OAB/PR).
PAINEL 4 (18h30): Patrimônio Histórico Cultural do Paraná entre a independência e a atualidade
a) Comissão organizadora: Comissão de Assuntos Culturais
b) Mediadores: Oksana Paludzyszyn Meister, Aurelio Cancio Peluso, Comissão de Assuntos Culturais
c) Palestrantes: Fábio André Chedid Silvestre (Doutorando em Planejamento Territorial e Urbano (PUC/PR). Membro do Conselho Municipal de Patrimônio Cultural de Curitiba. Vice-presidente da ADPPCC (Associação dos Detentores de Patrimônio Cultural de Curitiba)
Claudia Inês Parellada (Arqueóloga Coordenadora do Departamento de Arqueologia do Museu Paranaense e Docente Permanente do Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Paraná. Doutora em Arqueologia pela Universidade de São Paulo (2006)
Letícia Nardi (Arquiteta e urbanista, com especialização em Gestão do Patrimônio Cultural Integrado ao Planejamento Urbano da América Latina, pelo Programa ITUC/AL da Universidade Federal de Pernambuco e do Centro de Estudos Avançados da Conservação Integrada. Proprietária da empresa Inspire-C Arquitetura, Urbanismo e Patrimônio Cultural. É coordenadora dos projetos culturais: Patrimônio Edificado da Região Metropolitana de Curitiba e Nosso Patrimônio)
TERÇA-FEIRA, 13/9
PAINEL 5 (9h): 200 anos de independência: onde estavam as mulheres?
a) Comissões organizadoras: Comissão das Mulheres Advogadas
b) Mediação: Carolina Ritzmann (Membra da Comissão das Mulheres Advogadas)
c) Palestrantes
Dora Lucia De Lima Bertulio (Procuradora Federal em exercício na UFPR. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina.Visiting Scholar em Harvard Law School,
Teresa Cristina de Novaes Marques (Doutora em História pela Universidade de Brasília. Desenvolveu pós-doutoramento pela UFRJ. Atualmente, desenvolve estágio de pós-doutoramento na University of Texas, em Austin).
Laís Leão (Mestre em Gestão Urbana, Urbanista. Atua como pesquisadora convidada pela Fundação Alexander von Humboldt, em Berlim, Alemanha. Fundadora do projeto social inCities – Rede para Cidades Inclusivas).
PAINEL 6 (10h) Conquistas históricas da advocacia no Brasil ao longo dos 200 anos de história da independência
a) Comissões organizadoras: Comissão de Gestão e Empreendedorismo, Comissão de Direito Digital e Proteção de Dados, Comissão da Advocacia Iniciante
b) Mediação: Rafaela Vialle Strobel Dantas. Presidente da Comissão de Gestão e Empreendedorismo
c) Palestrantes: Rhodrigo Deda. Coordenador Geral de Inovação da OAB/PR. Ex-Presidente da Comissão de Inovação e Gestão da OAB-PR nas gestões de 2016-2018 e 2019-2021. Ex-membro consultivo da Comissão Especial de Gestão, Empreendedorismo e Inovação do Conselho Federal da OAB no triênio de 2019-2021
Dayana Uhdre (Doutoranda pela Universidade Católica de Lisboa. Membro Associada da BABEL-Blockchains and Artificial intelligence for Business, Economics and Law (Universidade de Firenze). Procuradora do Estado, coordenadora do curso de pós-graduação em direito dos criptoativos da ESMAFE-PR)
Roberto Leite (Conselheiro do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência de Curitiba. Conselheiro do Instituto Paranaense de Cegos. Membro do Movimento Visibilidade Cegos Brasil)
PAINEL 7 (13h30) – Distintas Origens, Distintas Condições, Distintas Convicções: O Exaustivo Trajeto de Reconhecimento Jurídico dos Imigrantes, das Pessoas com Deficiência e das Liberdades Religiosas no Curso do Bicentenário da Independência
a) Comissões organizadoras: Comissão de Direito e Liberdade Religiosa, Comissão de Direito Internacional e Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência
b) Mediador: Luís Alexandre Carta Winter (Advogado, Professor Universitário e Pesquisador. Professor na Graduação, no Mestrado e no Doutorado em Direito da PUCPR. Coordenador do Núcleo de Estudos Avançados em Direito Internacional (NEADI-PUCPR)
c) Palestrantes:
Juliana Ferreira Montenegro (Doutora em Gestão Urbana pela PUCPR. Professora da PUCPR e do Unicuritiba. Coordenadora do Curso de Especialização em Direito Constitucional e Direitos Humanos Fundamentais, bem como da Especialização em Direito, Logística e Negócios Internacionais, ambas da PUCPR)
Gilmara Pesquero Fernandes Mohr Funes (Mestre em Direito e em Educação pela Universidade do Oeste Paulista. Membro Relator da Turma de Instrução do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/PR. Integrante das Comissões de Gestão e Empreendedorismo dos Direitos da Pessoa com Deficiência, da OAB/PR)
Francielli Mores Gusso (Integrante das Comissões de Direito Internacional e de Direito e Liberdade Religiosa da OAB/PR. Professora do Unicuritiba e da Academia Brasileira de Direito Constitucional. Integrante do NEADI-PUCPR e participante externa do NESIDH-UFPR)