Estado policial, ativismo judicial e fragilização das garantias processuais penais foram temas de um dos painéis da tarde desta quarta-feira (15) da VIII Conferência Internacional de Direitos Humanos. O conselheiro federal paranaense e presidente da Comissão Especial de Garantia do Direito de Defesa da OAB Nacional, Juliano Breda, participou do debate. Também estiveram presentes o presidente da Comissão Especial de Direito Processual Penal da OAB Nacional, Gustavo Badaró, e a professora, advogada e escritora, Soraia Mendes.
Breda iniciou sua exposição citando as reflexões que o professor Gomes Canotilho fez ao prefaciar a obra Um ensaio sobre a Constituição da Europa, de Jürgen Habermas. “O professor Canotilho estabelece a matriz a respeito da indivisibilidade dos direitos fundamentais, ou seja, direitos fundamentais devem ter a mesma eficácia, a mesma densidade e serem igualmente respeitados em todos os lados e para todos. O desrespeito de um direito fundamental representa a desestruturação de todo o sistema de proteção”, pontuou o advogado.
Ele fez uma correlação com a realidade do Brasil atualmente. “No campo do processo penal brasileiro, até hoje não conseguimos oferecer uma aplicação com densidade mínima dos direitos fundamentais. Temos uma erosão dos direitos fundamentais no campo do processo penal”, constatou. “Se, no Brasil, é possível a aniquilação de direitos fundamentais contra grandes autoridades, o que não acontecerá nos casos da tradicional do sistema penal? Direitos fundamentais e direitos humanos em todos os lados!”, conclamou o presidente da Comissão Especial de Garantia do Direito de Defesa da OAB Nacional.
O conselheiro federal paranaense lamentou ainda a ”campanha pré-ordenada aos tribunais superiores, em uma tentativa de deslegitimação prévia de qualquer decisão que pudesse colocar em dúvida dos atos de [determinadas] autoridades”.
Direito das minorias
Badaró criticou a ideia de que, no processo penal, se tem o direito de uma maioria contra o direito de uma minoria, que é o do acusado. “É importante sempre lembrar que o estado democrático de direito não é o estado que assegura a vontade da maioria; isso é só um estado democrático. E não é só um estado que cumpre a lei, isso é só um estado de direito. Um estado democrático de direito é um estado que, de acordo com as leis, atende à vontade da maioria, mas respeita os direitos fundamentais de uma minoria, direitos fundamentais esses que nem uma maioria eventual ou temporária tem o poder de suprimir”, disse o advogado.
O presidente da Comissão Especial de Direito Processual Penal da OAB Nacional observou ainda que o processo penal é adotado com frequência como um caminho para a supressão de direito dos réus. “É fundamental que nós lembremos que a pessoa acusada só será culpada depois de um devido processo legal”, reforçou, lembrando que o direito ao contraditório e à legítima defesa não podem ser relativizados.
Ativismo judicial
Soraia observou que as decisões referentes a LGBTQIA+fobia e a direitos das mulheres – nesse caso especialmente no tribunal do júri, com a tese da legítima defesa da honra – muitas vezes são colocadas na vala do ativismo judicial. “Pensar o processo penal, pensar ativismo judicial, pensar um estado de polícia que pulsa, contido por uma capa de um estado de direito, não é deixar de considerar que os grupos identitários constroem discursos de natureza penal e processual penal que não contribuem para esse estado de polícia e para fragilização das garantias penais”, disse a professora.
A advogada ressaltou a importância da conscientização do que é o estado de polícia e das garantias processuais penais para além dos casos emblemáticos, com um olhar a partir das lentes que vêm se afirmando como as mais acertadas para análises das cortes. Na visão dela, os avanços no direito processual penal só serão efetivos quando a o viés das ditas minorias for frequentemente parte do contexto que é levado em consideração.