A advogada tributarista Betina Grupenmacher trouxe à audiência pública que discute a reforma tributária um olhar acadêmico e ponderações conceituais sobre as medidas propostas. O panorama traçado pela especialista é o de um sistema oneroso, permeado por recursos mal aplicados e altamente injusto em termos de justiça fiscal e social, além de muito complexo e que gera custos que muitas vezes superam a tributação das empresas que têm preocupação com Compliance.
“Temos um sistema tributário doente. Isso ninguém ignora. Mas não é fruto da concepção da constituinte, mas da má aplicação daquilo que foi concebido”, avalia a consultora da Comissão de Direito Tributário da OAB Paraná.
No entendimento da tributarista, uma reforma parcial traz riscos e poderia piorar o sistema, na medida em que não resolve a questão da desoneração e da justiça social. “O dinheiro tem que ser bem aplicado. O sistema pode ser concebido de forma justa, mas quem disse que esses recursos arrecadados serão aplicados em políticas públicas para pessoas que realmente precisam? A solução tem que ser global e orquestrada”, defende.
“A questão da complexidade do sistema está 80% centrada no ICMS. É uma loucura o que acontece nesse âmbito. O ICMS é o motivo maior de ausência de simplificação do sistema”, disse. “Diante do diagnóstico e das funções do sistema tributário, ambas as propostas de reforma têm pontos contrários e favoráveis para a doença que temos que curar”, disse.
“A função arrecadatória do tributo, por exemplo, está bem resolvida em todas as propostas. Parece que não haverá prejuízo de arrecadação, exceto em relação aos municípios. A proposta do Senado e da Câmara sugerem uma experiência de um a dois anos de testes”, analisa. “Havendo autonomia financeira, acho que não é um drama o que acontece com o pacto federativo até porque a alíquota será definida pelos entes federativos”, sustentou.
Em relação aos benefícios fiscais gratuitos sem contrapartida, Betina se posicionou radicalmente contra. “Se alguém deixa de pagar, outros terão que pagar por eles. Os benefícios não precisam ser 100% extintos na linha da proposta da Câmara, mas acho que temos que diminuir muito. Tem que haver instrumento de controle e os benefícios devem ser temporários”, defendeu.
Impacto – Para o Secretário de Finanças do Município de Curitiba, Vitor Puppi, a principal pergunta que deve ser feita é como a reforma vai impactar estados, munícios e união. “Isso não estamos fazendo. Estamos aceitando em nome da simplificação, construindo a casa pelo telhado”, disse. Ele enalteceu também a importância do princípio da correspondência fiscal, sustentando que a competência tributária deve ser atribuída ao ente que fornece o serviço público para a população. Para ele, é essencial considerar os recursos que serão alocados, para então pensar na reforma.
O advogado e ex-secretário da Fazenda do Paraná, Heron Arzua, acredita que não é necessário alterar a Constituição para melhorar o sistema tributário. Na sua opinião, o aperfeiçoamento do sistema pode se dar somente com alterações na legislação ordinária. O próprio ICMS pode ser comparado ao IVA, o problema é que ele foi totalmente descaracterizado. “Não respeitamos suas premissas básicas. Criamos um monstro, mas podemos modificar e, para isso, não precisamos mudar a Constituição”, defendeu.
“Somos o pior país do mundo em oferecer condições de investimentos. Não dá mais para esperar essa reforma”, enfatizou o advogado Luiz Roberto Peroba, para quem as mudanças devem ser radicais. “A própria Constituição dá as ferramentas para que o Congresso faça as reformas necessárias. Se em algum momento o nosso sistema não está funcionando, não se adapta à realidade, gerando o pior sistema tributário, a própria Constituição dá a saída”, disse.
Representando a Confederação Nacional da Indústria, Flávio Castelo Branco concordou que o sistema não tem como ser consertado, tem que ser mudado em quase toda a sua totalidade. “Estamos perdendo a capacidade de competir. Temos um sistema tributário anacrônico, ultrapassado, que foi tão distorcido que não tem o que melhorar, tem que refazer”, afirmou. Para Castelo Branco, é preciso ter a clareza de que a reforma tributária não vem para resolver o problema do tamanho do Estado e a sua necessidade de angariar recursos. Ela vem para criar um ambiente de negócios mais favorável para que o país possa crescer.