A audiência pública realizada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado na manhã desta segunda-feira (26), na sede da OAB Paraná, mostrou que algumas polêmicas ainda precisam ser superadas até a aprovação da nova Lei Geral do Esporte, a Lei Pelé. Embora a proposta de modificação – já aprovada na Câmara Federal e em discussão no Senado – contemple as principais reivindicações dos clubes de futebol, outros setores do esporte não se sentem atendidos. A audiência foi proposta pelo relator do projeto de lei 09/2010, senador Álvaro Dias. Ele presidiu o encontro na OAB, que teve a presença do ministro do Esporte, Orlando Silva, do governador Orlando Pessuti e de representantes de instituições envolvidas com o esporte. Para os setores que consideram o assunto quase esgotado, o projeto tal como está necessita de poucas intervenções no Senado. Segundo o ministro Orlando Silva, uma das principais mudanças propiciadas pelo novo projeto de lei é a valorização do clube que investe na formação de atletas, por meio de repasse de recursos. Orlando Silva também destaca entre os avanços o reconhecimento de características peculiares da atividade de futebol, que exigem flexibilidade em alguns temas da legislação, e o combate à “gestão temerária” nos clubes de futebol. “É uma lei que procura endurecer em relação à gestão temerária do futebol. Ela exige mais transparência e pune os dirigentes responsáveis por uma gestão temerária”, afirma o ministro.
O senador Álvaro Dias diz que uma das principais mudanças se refere à proteção aos clubes nas negociações de seus jogadores. “Há uma regulação mais eficiente da relação entre atleta, clube e empresário”, disse. Ele afirma que pretende incluir no relatório algumas modificações, como excluir a figura do monitor – que afeta os profissionais graduados em Educação Física; alterar o item referente à veiculação das competições esportivas; e analisar a proposta de clubes contratarem jovens aprendizes de 14 a 16 anos. Segundo o senador, o relatório do projeto deve ser apresentado em breve. Álvaro Dias diz que a proposta pode ir a plenário em 15 dias, caso o projeto não seja submetido a mais nenhuma comissão.
O presidente da Confederação Brasileira de Clubes (CBC), Arialdo Boscolo, defende que o projeto siga para votação o mais rápido possível, com o menor volume possível de alterações. “Esse projeto passou por um amplo entendimento na Câmara Federal, houve a manifestação de todas as entidades envolvidas com o esporte”, diz. “Agora é muito complicado mudar um projeto dessa natureza porque dificilmente vai se conseguir atender todo mundo.”
Polêmica
O artigo 90-E do projeto de lei 5186 foi um dos pontos mais discutidos durante a audiência pública. Vários profissionais e estudantes de Educação Física compareceram na audiência para reclamar da proposta, que prevê ao atleta o título de monitor, após 3 anos de comprovada prática desportiva. O presidente do Conselho Regional de Educação Física da 9.ª Região, Antonio Eduardo Branco, disse que o artigo conflita com a atividade dos profissionais de Educação Física. “É uma preocupação nossa, a prática somente não é suficiente para tornar o atleta um técnico desportivo. Também acreditamos que essa medida abre precedentes para outras profissões”, afirmou.
O presidente da Federação das Associações de Atletas Profissionais, Wilson da Silva Piazza, ex-jogador de futebol e tri-campeão pela Seleção Brasileira, elogiou a iniciativa do Senado de promover a audiência pública, mas estranha a pressa em aprovar o projeto. “É um projeto que estava adormecido desde 2005 na Câmara e de repente querem que seja concluído, sem discussão suficiente para chegar a um projeto mais adequado. É uma iniciativa boa, com perspectiva de mudar para aprimorar a lei que rege o desporto”, comentou Piazza. Uma das propostas da lei que a FAAP defende é o funcionamento efetivo do sistema de assistência complementar para os atletas profissionais e em formação, valorizando também o lado social. “Independente do valor que será destinado para o sistema de qualificação, a lei precisa prever mecanismos para que o repasse ocorra efetivamente, sem que a gente precise correr atrás”, diz Piazza. Ele se refere ao artigo 57, que prevê o atendimento para atletas de todas as modalidades.
Segundo o procurador do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) Paulo Schimitt, as alterações da lei priorizam o futebol, em detrimento de outras modalidades desportivas. “A proposta é de uma lei geral do desporto e não do futebol. É necessário mudar a lei, mas há necessidade de maior debate”, disse o procurador. Os representantes do futebol, no entanto, discordam. O presidente da Federação Paranaense de Futebol, Hélio Cury, diz que as mudanças para o futebol que estão no projeto são necessárias. O vice-presidente do Clube dos 13, Marcos Augusto Malucelli, manifestou interesse na aprovação do projeto ainda neste ano. “Do jeito que está atende nossas expectativas.”
A primeira pessoa a se manifestar na audiência após a fala dos convidados foi a procuradora do Ministério Público do Trabalho Margarete Mattos de Carvalho. Ela também reclamou da falta de debate mais amplo para aprovação da proposta. “O projeto trata de contratos de trabalho, com atletas a partir de 16 anos, que é considerado aprendiz, e nos interessa saber se os direitos trabalhistas vão ser atendidos. Na prática, vemos que falta reconhecer que todo atleta profissional deve ter um contrato de trabalho registrado, com garantias de férias, 13.º salário, pagamento de horas extras. Os jovens atletas, que também estão matriculados, acabam com baixo rendimento escolar e comprometidos fisicamente. São questões que precisam ser debatidas”, comentou a procuradora.
O conselheiro da OAB Paraná Alexandre Quadros, advogado da área desportiva e ex-presidente da Comissão de Justiça Deportiva da OAB Paraná, disse que a Comissão na gestão anterior vinha acompanhando as discussões sobre alterações na Lei Pelé, com a preocupação em promover maior discussão para melhorar diversos pontos da lei, em especial sobre quatro temas: justiça desportiva; o atendimento ao sistema de aprimoramento da Federação das Associações de Atletas Profissionais (FAAP); atendimento ao profissional de Educação Física no que se refere ao artigo 90-E e aprimorar aspectos voltados para os atletas profissionais. “São emendas importantes para a comunidade esportiva”, comentou Quadros.