Em entrevista à revista O Trabalho, Glomb critica a terceirização

O presidente da OAB Paraná, José Lucio Glomb, é o entrevistado da última edição da revista O Trabalho, publicada pela Editora Decisório Trabalhista. Na entrevista, Glomb aborda diversos temas, entre eles o da terceirização. Confira a íntegra da entrevista.

“A TERCEIRIZAÇÃO É UM ABUSO CONTRA O TRABALHADOR”

“TST, não raramente, enfrentava problemas de responsabilidade pelos terceirizados”

José Lucio Glomb – um dos fundadores da Associação dos Advogados Trabalhistas do Paraná, formado em 1976 pela UFPr. Exerce o cargo de conselheiro da OAB-Pr, onde também foi presidente da Comissão de Direito do Trabalho. Exerceu a presidência do Instituto dos Advogados do Paraná, cargo que deixou para exercer a presidência da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Paraná, onde vem se destacando com um amplo papel contra a corrupção, estando a frente do movimento O Paraná que Queremos, com grande mobilização da população do Paraná. Atua pela ampla valorização da advocacia e melhoria estrutural do Poder Judiciário. Será anfitrião da XXI Conferência Nacional dos Advogados, a ser realizada em novembro próximo, sob o tema Defesa da Liberdade. Democracia e Meio Ambiente.

O Trabalho – A PEC dos Recursos assegurará a celeridade da tramitação dos processos?
José Lúcio Glomb – Ao longo dos anos temos visto um aumento no número de processos, em todas as áreas. Após a promulgação da atual Constituição, isto foi ainda mais sentido, mas não houve a correspondente melhora na estrutura da Justiça. O número de juízes não acompanhou esse aumento de ações e essa situação ficará ainda mais evidente quando vemos a implantação do processo eletrônico. Certamente ele eliminará cargos de servidores e exigirá um número maior de juízes. Tivéssemos uma estrutura adequada e não se falaria agora em supressão de recursos. Nossa posição é contrária a qualquer supressão de recursos e, sim, favorável a que ocorram as condições para que eles sejam julgados com rapidez e presteza. Diminuir recursos não é a melhor solução para se tentar maior celeridade. Lembro que já há existem barreiras para admissão de recursos aos tribunais superiores. A continuar assim, daqui a pouco vamos matar o paciente para resolver a situação. Não, não é isso que queremos e a OAB, em todo o Brasil, já adotou posição contrária à PEC do Ministro Peluso.
O Trabalho – A resolução nº 130 do CNJ, que fixou horário uniforme de atendimento ao público nos Tribunais do País, deixa o judiciário mais perto da sociedade?
José Lúcio Glomb – A resolução 130 do CNJ decorreu da diversidade de horários de funcionamento da Justiça, nos mais diversos estados. É claro que existem diferenças entre nós, pois vivemos num país continental. A realidade do Rio Grande do Sul difere do Amapá. Mas é certo que quanto mais os foruns estejam abertos, mostrando o funcionamento do judiciário de forma ampla, teremos uma maior credibilidade e proximidade dos cidadãos. Penso que deveríamos abrir todas as instalações judiciárias das 8 às 18 horas em todo lugar, de segundas a sextas-feiras. Com a presença de todos os servidores, em especial dos juízes. As diferenças climáticas são facilmente resolvidas e isto certamente haverá de proporcionar mais produtividade e qualidade no trabalho. Mas a parte da manhã poderia ser reservada para serviços internos e atendimentos exclusivos aos advogados, pois são eles que representam os interesses dos que procuram a Justiça. Se eles tiverem boas condições de atendimento, isto levará a menos estresse e maior agilidade. A realidade de hoje mostra que os balcões dos serviços judiciários são tomados pelo cidadão que busca informar-se, sem maior conhecimento técnico. E isto demanda muito tempo de atendimento. O mesmo ocorre com estagiários, que buscam ver o andamento de dezenas de processos. Se um advogado chegar logo após, poderá esperar muito tempo. Isto custa caro e acarreta tumulto, críticas e situações que poderiam ser facilmente resolvidas com o atendimento matutino exclusivo aos advogados. Mas em relação à resolução 130, lembro que há liminar do STF suspendendo a sua imediata aplicação.

O Trabalho – Como vê a exigência de Certificação de Débitos Trabalhistas para contratações públicas?
José Lúcio Glomb – A exigência desse certificado serve como um estímulo para que ocorra a regularização dos pagamentos, por parte daqueles que tem interesses com a administração publica. A alteração da CLT, inserindo o artigo 642-A, certamente fará com que empresas habituais frequentadoras dos bancos da Justiça do Trabalho sejam impedidas de participar de licitações, a partir da verificação da sua inadimplência. E isto aplica-se de forma ampla, tanto quanto a dívidas trabalhistas, como previdenciárias, honorá- rios, custas e emolumentos. Acredito que haverá maior cuidado por parte das empresas para com as suas obrigações. Certamente isto será um bom mecanismo para abreviar a execução.

O Trabalho – Que cautelas devem ser tomadas no processo de seleção para os contratos de terceirização?
José Lúcio Glomb – A terceirização é um abuso contra o trabalhador. Ela somente deveria ser admitida com uma ampla revisão de toda a legislação trabalhista, aí compreendida a reforma fiscal em especial, pois ela é que efetivamente onera os contratos de trabalho. Mas a realidade é outra. Basta ingressar nos nossos próprios tribunais para ver que a terceirização está muito presente ali mesmo, desde a entrada. Outro dia, assistindo a uma palestra de ministro do TST tive notícia que aquela Corte, não raramente, enfrentava problemas de responsabilidade pelos terceirizados. O que dizer das demais empresas públicas e privadas. Mas não vamos fugir do que aí está estabelecido. Então o melhor é adotar providências preliminares para evitar que as empresas que fornecem a mão de obra não venham a desaparecer, deixando os empregados a ver navios e o tomador de serviços com o cabelo em pé. Ou sem cabelos. A exigência de certidões de dívidas trabalhistas e outras, a que me referi anteriormente, ajudará. Ter informações atualizadas e abalizadas sobre a idoneidade e o passado da empresa que presta serviços, certamente será da maior importância. Mas caberá sempre ao tomador dos serviços assumir um papel de vigilância intensa e constante, exigindo os comprovantes de pagamentos e recolhimentos. É um ônus que lhe cabe. A sua omissão pode custar caro. Não esqueçamos, ainda, do grande risco que corre o tomador dos serviços em relação a contratação de determinadas pessoas físicas, travestidas de pessoa jurídica com o fim de fraudar os princípios da CLT. Normalmente aí está um verdadeiro contrato de trabalho, com uma outra roupagem, disfarçada mas que não sobreviverá diante de um exame mais apurado. As consequências são enormes.

O Trabalho – Monitoramento do e-mail no ambiente de trabalho?
José Lúcio Glomb – A nossa Constituição garante a intimidade à vida privada. Todavia, o Email usado em serviço, inerente ao trabalho, não pode ser objeto dessa garantia. Aqui estamos tratando de um instrumento de trabalho, ao qual o empregador pode e deve ter pleno acesso. Se o empregado o usa indevidamente, deverá responder por isto e é exclusivamente sua a responsabilidade pelo seu ato. De outro lado, Emails e o uso de telefone celular pessoais, no horário de trabalho, somente podem ser usados se autorizados pelo empregador. Neste caso, se o empregador admite o uso do Email pessoal, incide a garan-tia constitucional. É claro que o uso de Email pessoal, contrariando norma da empresa sujeita o empregado às penas trabalhistas. Por isso a clareza nas definições é importante.

O Trabalho – Como classifica o processo eletrônico com peticionamento e acesso do Certificado digital? O sistema não deveria ser unificado para melhor desempenho profissional em qualquer estado brasileiro pelo advogado?
José Lúcio Glomb – Vivemos numa era de inovações tecnológicas indiscutíveis. A cada momento somos surpreendidos por inovações. O processo pelo meio eletrônico está nessa esteira e deverá ser implantado em todo o judiciário brasileiro. Se será bom ou não, o futuro dirá. De minha parte, faço restrições a diversidade de sistemas existentes no Brasil. Fizemos uma verificação e apuramos 45 variações de sistemas de processo pelo meio eletrônico. Isto não é aceitável. Agora vem aí um denominado PJE, para tentar unificar. Mas ele ainda não está inteiramente pronto. Concluo que nós estamos fazendo experiências de processo eletrônico em tempo real, com dados reais, que poderão influir nos direitos do cidadão. Existem aspectos positivos, mas também outros negativos. Os Tribunais, dentro da possibilidade que lhes outorgou a lei 11419, de 2006 – a lei da informatização do processo judicial – acabam por expedir resoluções que diferem entre si.
O correto, ao meu ver, seria implantar todo o sistema de acompanhamento processual, incentivar o peticionamento eletrônico, para que ele proporcionasse experiên-cia aos juízes, advogados, servidores e daí sim implantá-lo desde o início, para que tenhamos o processo sem papel.
Em casos complexos, também deveria ocorrer a oportunidade para a convivência com o processo em papel, até que lá na frente, isto fosse resolvido. Tudo ao seu tempo, com calma e não como uma imposição ditatorial.
Repito que não sou contra o processo eletrônico, mas sou contra a forma como ele está sendo implantado, que traz insegurança e prejuízo às partes e aos advogados.
A certificação digital, usada para maior segurança, deveria ser fornecida gratuitamente pelos Tribunais e ter um prazo de validade mais amplo. Três anos é muito pouco. Deveria ser no mínimo o dobro disto, com prorrogação já, dos atuais certificados. Dentro em pouco teremos um caos na renovação desse certificado. Afinal, quem é que lucra com a expedição das certificações? Posso assegurar que a OAB não ganha nada, apenas sofre o desgaste da sua imposição na forma atual.

O Trabalho – Qual o maior desafio e as consequências jurídicas dos ataques dos hackers no judiciário?
José Lúcio Glomb – Os bancos gastam verdadeiras fortunas para garantir a segurança de seus sistemas. Ainda assim são invadidos. Noutro dia três grandes bancos nacionais tiverem queda de sistemas, não permitindo que seus correntistas tivessem acesso às contas por dois dias. Li que eles já gastaram mais de 23 bilhões de reais só em tecnologia da informação. O que dirá do Judiciário. Se invadem até o Pentágono, porque não invadiriam os sites dos Tribunais? O tema deve ter sido objeto de grande cuidado, mas diante do que vemos, não há sistema infalível.
O Trabalho – O exame da OAB corre perigo?
José Lúcio Glomb – Sempre existirão aqueles contrariados com o Exame de Ordem. Hoje temos 650 mil estudantes cursando direito. É um número astronômico, fruto da autorização indiscriminada de cursos de direito desde os anos 90. As reclamações partem de quem cursa faculdades que não oferecem condições de bom ensino. Ou daqueles que não se prepararam adequadamente. E ainda há a grita dos cursos de direito que tem caráter comercial, sem preocupar-se com a formação do bacharel. Ninguém é pego de surpresa com o Exame. Ele existe há muito tempo. Quando ingressa na faculdade, o aluno já sabe de antemão que deverá, ao final, prestar o Exame. Em recente levantamento feito pela FGV, que cuida do Exame de Ordem unificado, a esmagadora maioria dos candidados se posicionou favoravelmente ao exame de ordem. Eles sabem que se for suprimido, quem sofrerá será o próprio cidadão brasileiro. Posso afirmar, também, a sua constitucionalidade, pois a nossa Carta prevê a liberdade de exercício das profissões, atendidas as qualificações profissionais que a lei exigir. Isto está no artigo 5º, XIII. O nosso Estatuto, a lei 8906/94, estabelece a exigência do exame de ordem. Por fim, ele está presente em um grande número de países, desde os Estados Unidos, onde apenas habilita para a advocacia no estado em que for prestado – passando pela Alemanha, Suíça, Japão, dentre tantos outros. Desejo lembrar que a OAB não tem por objetivo arrecadar com o Exame, como muitos falam. Fosse isto, admitiria logo todos os bacharéis, que são em torno de 2 milhões, que passariam a pagar anuidade em valor maior. Existem custos a cobrir e o exame não pode ser de graça. Também não há reserva de mercado, pois somente nos exames de 2010 foram aprovados mais de 41 mil bacharéis, agora advogados. Isto significa quase uma Argentina de advogados por ano, pois lá existem 48 mil advogados. Ou mais que um Paraná, que tem 40 mil advogados inscritos. Por ano! Como se falar em reserva de mercado com esses números? O MEC deve fiscalizar melhor e, se for o caso, eliminar rigorosamente os cursos ineficientes. O Exame de Ordem é uma garantia ao cidadão.

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