O impacto do marco regulatório das organizações do terceiro setor instituído pela lei 13.019/2014 sobre as doações dirigidas e o modo como os Conselhos Gestores devem lidar com a questão foram o tema de um colóquio organizado na manhã desta terça-feira (12/12) por três comissões da OAB Paraná – Direito do Terceiro Setor, Criança e Adolescente e Direito do Idoso. As comissões são presididas, respectivamente, pelos advogados Roque Ribeiro da Silva, Anderson Rodrigues Ferreira e Rosângela Maria Lucinda.
Foram convidados a expor suas reflexões sobre o tema a promotora de Justiça do Ministério Público do Paraná Terezinha de Jesus Souza Signorini; a procuradora do Estado do Paraná Jozélia Nogueira Broliani; o prefeito de Fazenda Rio Grande e presidente da Associação de Municípios da Região Metropolitana de Curitiba, Marcio Claudio Wozniack; Débora Cristina Reis Costa, do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA); e o advogado Leandro Marins de Souza.
Terezinha Signorini abriu as apresentações lembrando que a nova lei suscita polêmica e espaços para intepretação, mas que seu espírito não é o de retroceder nas conquistas. “A captação de recursos é uma dinâmica consolidada e tem como base o princípio da confiança. Portanto, só por uma excepcionalidade pode ser desconsiderada a vontade do doador”, afirmou.
Em consonância com a palestra anterior, a procuradora Jozélia Broliani reforçou que é possível, sim, fazer a doação dirigida. “Basta contabilizar como ingresso, o que significa que é um dinheiro que entra e sai”, explicou. A procuradora deu uma sugestão para solucionar a questão das entidades menos visíveis à sociedade. “Com um ajuste na lei federal é possível destinar um percentual da doação dirigida para entidades em geral”, disse.
Marcio Claudio Wozniack lamentou que os esforços para captação de recursos fiquem ameaçados com algumas interpretações da Lei 13.019. “Será que tudo o que fizemos foi por água abaixo?”, questionou. Wozniack passou a palavra ao presidente do Colegiado de Gestores de Assistência Social do Paraná (COGEMAS), José Roberto Zanchi, que explicou detalhadamente como as doações dirigidas estão funcionando.
Para a conselheira Débora Cristina Reis da Costa é preciso avançar. Segundo ela, nem todos os municípios regulamentaram os Bancos de Projeto. “Há indagações por parte do Tribunal de Contas, mas nenhum parecer específico sobre o mecanismo da doação dirigida”, afirmou.
O advogado Leandro Marins de Souza fechou as palestras programadas saudando o consenso havido nas manifestações. “Todos são favoráveis ao banco de projetos e às doações dirigidas. A divergência é, na minha visão, uma questão semântica. Basta notar que o modelo é muito semelhante ao que se vê, por exemplo, na Lei Rouanet, com a destinação para um projeto específico”, destacou. Marins de Souza lembrou que as doações cresceram enormemente desde 2008, quando foram criados os Bancos de Projetos. Para ele, sem as destinações dirigidas isso acaba. “A identificação de quem opta pelo modelo com um projeto em particular justifica toda a sistemática da doação dirigida”, completou.
Constitucionalidade
Parecer técnico
Ao fim dos debates, o presidente da Comissão da Criança e do Adolescente, Anderson Rodrigues Ferreira, leu o parecer oficial da OAB Paraná sobre o tema. O documento foi emitido pelos advogados Rodrigo Kanayama e José Arthur Castilho Macedo, respectivamente presidente e integrante da Comissão de Estudos Constitucionais da seccional. De acordo com o parecer, o banco de projetos se apresenta como um estímulo à contribuição e não é prática inédita no direito brasileiro, refletindo uma mudança no papel do Estado ocorrida no século passado. "Trata-se daquilo que Norberto Bobbio e outros autores designaram como 'sanções premiais', uma forma de fomento empregada pelo Estado para que particulares adotem determinados comportamentos sem necessidade de coação. Tal técnica é utilizada recorrentemente pelas administrações tributárias para adiantar o pagamento de tributos, pois é oferecido ao contribuinte um ´desconto´ do valor a ser pago. Assim, verifica-se que o Banco de Projetos estimula a doação por parte dos particulares, recompensando-os com a redução do valor a ser cobrado no Imposto de Renda, o que está de acordo com a ordem constitucional", diz o documento. Ainda segundo o parecer, há três motivos para que as pessoas aceitem pagar tributos: o sentimento de que haverá bom uso do dinheiro, a afetação e a transparência. "Quanto ao princípio da legalidade, não se vislumbra que limitações procedimentais sobre a forma de deliberar a respeito da gestão de recursos impeça que o doador estipule algum encargo. Isso decorre da própria natureza do instituto da doação e da inexistência de proibições na legislação para doações com encargos", prossegue o texto. "Não se vislumbra também inconstitucionalidade, vícios ou empecilho em relação à forma com que se dará a fiscalização do fundo, porquanto, conforme o parágrafo 4º do artigo 260 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), caberá ao Ministério Público a fiscalização desse fundo", conclui o documento.