Os desafios e perspectivas para o controle externo do Judiciário foram o tema do painel presidido pelo conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, que teve o ex-presidente da OAB Paraná Cássio Telles entre os palestrantes.
O procurador Nacional Adjunto de Prerrogativas da OAB Nacional trouxe uma visão sistêmica da defesa das prerrogativas da advocacia no CNJ. Telles iniciou a exposição com um breve histórico da criação do Conselho, trabalhado no seio da OAB desde a Conferência Nacional de Belém, em 1986, e discorreu sobre seu relevante papel.
“O CNJ não é apenas um órgão censório e correicional, suas funções administrativas, vão desde o controle dos atos administrativos editados pelos Tribunais, passando pelo controle dos gastos financeiros dos mesmos, chegando à função de liderar a organização, modernização e fixação de diretrizes para melhoria da prestação jurisdicional”, frisou.
Nos primeiros anos de atuação, pontuou Telles, o CNJ expediu importantes resoluções no sentido de estabelecer regras nacionais para organizar a prestação jurisdicional. “As resoluções iniciais tocaram em temas fundamentais, tanto para a organização, como para a modernização do Poder Judiciário e também para atacar uma das maiores reclamações da sociedade em relação à Justiça, a morosidade”, disse, trazendo exemplos como as Resoluções CNJ n. 4/2005 e 15/2006, que criaram e regulamentaram o Sistema de Estatística do Poder Judiciário.
“Depois da organização do Judiciário nacional, com a edição das resoluções e recomendações, bem como do estabelecimento das metas, começou a surgir com mais ênfase a atividade censória e correicional do Conselho”, prosseguiu.
Segundo Telles, a atuação e a democratização do acesso ao CNJ, trouxe novos desafios, como o problema do congestionamento frente a grande quantidade de solicitações e o grande volume de atos editados. “A última resolução editada, quando esse texto estava sendo redigido (outubro de 2023), tinha o número 525. Atualmente são 335 resoluções vigentes”, disse.
Prerrogativas da Advocacia
O ex-presidente da OAB Paraná abordou ainda aspectos das gestões dos ministros Dias Toffoli, Luiz Fux e Rosa Weber e as perspectivas da gestão do ministro Luiz Roberto Barroso, que destacou em sua primeira sessão no CNJ, em outubro de 2023, que sua gestão focará no desenvolvimento de três softwares, um que seja capaz de resumir a inicial e a contestação, bem como a sentença e as razões recursais, a fim de facilitar a análise dos processos pelos magistrados.
Para Telles, “o uso da inteligência artificial para agilizar a tramitação dos processos, para descongestionar a Justiça, para auxiliar na segurança jurídica é bem-vindo, mas a discussão deve se dar a partir do entendimento de que o processo é também das partes”. “A jurisdição é prestada a partir da provocação feita pelo jurisdicionado, que é o destinatário final do serviço público judicial”, frisou.
Telles sublinhou que os advogados são dotados, por força de lei, da capacidade postulatória em favor dos jurisdicionados. “A advocacia tem se imposto contra a realização das sustentações gravadas, bem como a negativa da prerrogativa de retirada de processos de julgamento nas pautas virtuais. Nesse particular, a atuação do CNJ deve ser atenta e cuidadosa. A advocacia é o elo de ligação entre o Judiciário e a população, pois é ela quem transforma os reclamos e anseios da população, por justiça, em pretensões a serem dirimidas pelo Judiciário”, afirmou.
“O uso da palavra na profissão da advocacia é fundamental. O contato direto com o magistrado, seja por meio das audiências individuais, para entrega de memoriais ou para indicar alguma particularidade, ou mesmo a urgência do caso concreto, a possibilidade de participar efetivamente das audiências de instrução, fazendo as perguntas às partes e testemunhas, a possibilidade de sustentar oralmente em sessões de julgamento, no mesmo tempo em que elas ocorrem, são condições fundamentais para o bom exercício da advocacia, em prol da efetivação da cidadania”, defendeu.
Propostas
A partir das reflexões fomentadas durante a palestra, Cássio Telles propôs seis enunciados:
1.É do advogado o direito de escolher entre a realização de audiência presencial ou telepresencial, exceto no Juízo 100% digital (Resolução CNJ n. 345/2020) em que a audiência será sempre por vídeo conferência);
2.No plenário virtual, havendo interesse do advogado em realizar sustentação oral, o processo deverá ser levado para sessão de julgamento presencial ou telepresencial, com possibilidade de sustentação oral em tempo real;
3.O uso da inteligência artificial como auxílio na prestação jurisdicional, deve ser desenvolvido com efetiva participação da OAB, perante o CNJ e os Tribunais, e ampla transparência na análise dos algoritmos e sistemas desenvolvidos, além de constante monitoramento e recalls na sua utilização;
4.Qualquer sistema baseado em inteligência artificial deve permitir ao advogado a invocação de distinguishing, com o enfrentamento direto e fundamentado da particularidade, na decisão judicial;
5.O combate ao excesso de litigiosidade não deve ser feito por meio de exigências formais que recaiam no jurisdicionado, de forma generalizada;
6.O acesso à ordem jurídica justa, garantia que deve assegurar decisões fundamentadas, com efetiva participação das partes e análise dos fatos e argumentos do caso concreto, inclusive suas particularidades, continua sendo um direito da cidadania, mesmo com o advento das novas tecnologias do processo digital e da inteligência artificial. A modernidade é bem-vinda, para trazer agilidade e segurança jurídica, porém sem substituir a atuação de juízes inseridos na realidade social.
Outros debates
O procurador da Fazenda Nacional Paulo Mendes também integrou o painel, com uma exposição sobre o papel das resoluções e recomendações do CNJ como fontes do direito e soft law. O juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (TRT-6) Leandro Fernandez abordou o tema CNJ: Administração Judiciária, Boas Práticas e Competência Normativa.
A Recomendação 134/2022 e a Função Nomofilácica (sobre a estabilização dos entendimentos) do Poder Judiciário foi tratado por Bruno Fuga, professor da PUC-SP. O texto em questão dispõe sobre o tratamento dos precedentes no direito brasileiro.
A magistrada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) Priscilla Pereira da Costa Corrêa discorreu sobre as fronteiras do acesso à Justiça, propondo reflexões sobre a promoção do racionamento e a priorização de oportunidades de justiça distributiva em ambiente de litigiosidade excessiva.
Já o procurador do Estado de Alagoas Marcelo Brabo Magalhães falou sobre novas perspectivas de políticas judiciárias para a melhoria do regime de custas judiciais e gratuidade de Justiça.
Por fim, as políticas judiciárias sob a perspectiva das limitações orçamentárias, do uso das novas tecnologias e da atenção ao jurisdicionado enquanto destinatário dos serviços jurisdicionais foram discutidas pelo juiz federal de São Paulo e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Paulo Cezar Neves Junior.