O presidente da OAB Paraná, Cássio Lisando Telles, publicou um artigo no site jurídico Migalhas sobre o crescente entendimento que defende que Centros Judiciários de Solução de Conflitos não é necessária a presença de advogados para acompanharem as partes. Ele ressalta que a advocacia é grande incentivadora da conciliação, mas que também a Constituição Federal prevê a indispensabilidade do advogado à administração da Justiça. Confira a seguir a íntegra do texto.
A solução consensual de conflitos é algo que deve ser buscado por todos aqueles que foram encarregados de promover Justiça. É uma solução rápida, que é capaz de produzir muito mais pacificação do que a resolução de litígios, por sentença.
Há um grande esforço por parte do Judiciário em promover e difundir essa cultura de solução consensual de disputas, utilizando-se da mediação e da conciliação.
A advocacia sempre foi entusiasta da solução consensual, na realidade, por muitas vezes, advogados resolvem conflitos mediando diálogos extrajudiciais, evitando o ingresso em Juízo. Não é à toa, que o Código de Ética da Advocacia prevê no inciso VI, do parágrafo único, do artigo 2º., que é dever do advogado, “VI – estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios;”
É, pois, dever da advocacia buscar o entendimento.
No entanto, cresceu, ultimamente, especialmente na magistratura, a corrente que defende que nos Centros Judiciários de Solução de Conflitos, encarregados de promover conciliação e mediação de demandas apresentadas ao Poder Judiciário, a presença do advogado é dispensável, quando se tratar de reclamação pré-processual.
Dizem os defensores dessa corrente que a solução consensual deve ser desburocratizada, e assim advogados não devem ser considerados indispensáveis. Argumentam também que está no campo das disponibilidades individuais transigir, o que não exige a presença de um advogado para assessorar a parte interessada.
Há aí uma forte dose de preconceito contra a advocacia, porque parte de uma equivocada ideia de que advogados atrapalham as conciliações e mediações.
Esse equívoco, lamentavelmente, conduz a resultados incompatíveis com o exercício pleno da cidadania, que pressupõe, quando violados direitos, o acesso ao Judiciário com a assistência jurídica a todos os cidadãos. E, ainda, que esse acesso se dê no ambiente dos CEJUSCs, ainda que seja na forma de reclamação pré-processual, existe aí, sempre, uma postulação jurídica e há uma solução de conflito mediante a intervenção de uma autoridade, no caso o mediador ou conciliador que representam o Judiciário.
A Constituição Federal prevê que, para os necessitados, a assistência judiciária deve ser promovida pelo Estado (art. 5º., LXXIV – o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos).
O conhecimento das leis, a interpretação jurídica, a correta aplicação do ordenamento legal exige preparo técnico profundo. Num País onde o corpo de normas que regem as relações sociais é composto de vasta legislação, naturalmente o estudo do Direito é essencial para uma boa postulação e para uma solução justa dos conflitos.
A renúncia a direitos pode se dar por ato voluntário, mas também pelo próprio desconhecimento do leigo, que ao postular, invoca, por exemplo, menos do que a lei lhe assegura.
No cenário processual, a advocacia aparece como atividade indispensável à administração da Justiça, a quem compete postular e orientar tecnicamente as pessoas físicas e jurídicas que recorrem ao Poder Judiciário. É interessante observar que desde a República Romana, os cidadãos já se davam conta de que postular acompanhados de advogados, lhes permitia uma defesa mais eficiente do direito que buscavam ser tutelado.
Conciliar envolve sempre concessão. Concessão envolve renúncia e renúncia deve ser sopesada e conhecida previamente, porquanto, ao ser feita perante o Judiciário torna-se imutável e irretratável. O mediador, o conciliador e o próprio julgador, por ocuparem posição equidistante em relação às partes, não podem aconselhar sobre as consequências do ato conciliatório, não podem dizer que direitos estão sendo renunciados. Suas tarefas são de aproximação e de promoção da convergência. Quem pode orientar as partes, é apenas o advogado.
O CNJ produziu, no julgamento do pedido de providência 0004837-35.2017.2.00.0000, uma decisão por maioria de votos, entendendo dispensável a presença da advocacia nos CEJUSCS. A OAB, por sua vez, luta pela aprovação do PL 5.511/16, que estabelece a indispensabilidade da advocacia nos CEJUSCS.
Esse projeto já foi aprovado na Câmara e aguarda deliberação no Senado.
Não se pode pensar Justiça, sem advogados, porque foi a Constituição Federal que estabeleceu no artigo 133, a sua indispensabilidade à administração da Justiça. E, repete-se, a Carta Magna garante até mesmo aos carentes a assistência judiciária por defensores e advogados. Ter advogado é um direito do cidadão.
Conciliar mal, sem esclarecimento suficiente, pode ser fonte de mais discórdias, que surgirão futuramente, pois o conflito não se resolve no papel, mas sim na percepção e certeza pelas partes de que a solução encontrada lhes atende. Quem descobre, depois, por falta de orientação que uma solução consensual foi lesiva, certamente sentir-se-á injustiçado e, então, a almejada pacificação do conflito não terá ocorrido.