Artigo: Os 130 anos da Abolição da Escravatura no Brasil e a luta pela igualdade

Confira o artigo da presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB Paraná, Silvana Cristina de Oliveira Niemczewski, em alusão aos 130 anos da abolição da escravatura no Brasil:

 

Os 130 anos da Abolição da Escravatura no Brasil e a luta pela igualdade

 

A Lei Áurea, que aboliu oficialmente a escravidão no Brasil, foi assinada em 13 de maio de 1888. O Brasil foi o último país livre do Ocidente a abolir totalmente a escravatura. Essa data é algo a ser reelaborado, porque houve uma abolição formal, mas os negros continuaram excluídos do processo social. A razão é o tratamento dispensado aos libertos e seus descendentes no país. Naquele momento, faltou criar as condições para que a população negra pudesse ter um tipo de inserção mais digna na sociedade.

De acordo com o sociólogo Florestan Fernandes (1920-1995), em sua obra “A integração do negro na sociedade de classes” (1964), após o fim da escravidão, as classes dominantes não contribuíram para a inserção dos ex-escravos nos novos formatos de trabalhos.

Verifica-se que após a abolição, a vida dos negros brasileiros continuou muito difícil. Tiveram, agora livres, que se auto adaptar numa sociedade competitiva, buscar por seus próprios meios as condições mínimas para sua subsistência e dignidade, seja de moradia, alimentação e educação principalmente, num meio social onde tudo lhes era hostil e adverso.

O recém-criado Estado republicano brasileiro continuou relegando os negros (as), não se preocupou em oferecer condições para que os libertos pudessem ser integrados como cidadãos de pleno direito, notadamente no mercado de trabalho formal e assalariado. Prova disso foi a preferência pela mão de obra dos imigrantes recém-chegados ao Brasil, que aumentou muito na segunda metade do século XIX, resultando numa política de embranquecimento social, produto dos preconceitos e estigmas que caiam sobre o povo negro, potencializados por conceitos pseudocientíficos e filosóficos, intrínsecos de uma sociedade eminentemente racista.

Ao longo do século XX, as mudanças de regimes políticos e os processos de industrialização e urbanização do país promoveram grandes mudanças na sociedade nacional, sobretudo nas novas condições de trabalho, políticas salariais, previdenciária, etc, trazendo consequentemente benefícios ao povo negro, sem, contudo, alterar sua posição na sociedade como também suas condições existenciais de miséria e exclusão.

No limiar do século XXI são ainda os negros e pardos a maioria dos encarcerados, as maiores vítimas da violência, a maior população nas periferias e favelas, a maioria dos subempregados e dos piores indicadores sociais e econômicos do país, efeitos de uma abolição tardia, odiosa e inacabada.

Há um ordenamento jurídico visando a proteção da dignidade da pessoa humana, sobretudo a liberdade e a igualdade.

Conforme destaca a nossa Constituição Federal,

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;

Sabemos que o crime de racismo atinge uma coletividade indeterminada de indivíduos, discriminando toda a integralidade de uma raça. Já a injúria racial consiste em ofender a honra de alguém valendo-se de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem.

A Lei 10.639/03 fez-se necessária para garantir uma ressignificação e valorização cultural das matrizes africanas que formam a diversidade cultural brasileira. Os professores exercem importante papel no processo da luta contra o preconceito e a discriminação racial no Brasil.

A Lei 12.288/10 institui o Estatuto da Igualdade Racial, tendo por escopo a correção de desigualdades históricas na sociedade brasileira, por meio do estabelecimento de políticas de educação, saúde, cultura, esporte, lazer e trabalho para a população negra, bem como defesa dos direitos das comunidades quilombolas e proteção de religiões de origem africana. No entanto, questiona-se se, efetivamente, tal instrumento legal é apto à correção das alegadas diferenças no Brasil, bem como se, porventura, a legislação em questão de fato atenta à realidade da formação social no país. Dessa forma, cumpre analisar se a lei em análise será capaz de atingir os fins pretendidos ou, em sentido contrário, poderá acarretar até mesmo um gravame na dita desigualdade entre os cidadãos.

Art. 1º Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

Neste intuito, a Assembleia Geral da ONU proclamou o período entre 2015 e 2024 como a Década Internacional de Afrodescendentes, cujo tema é “reconhecimento, justiça e desenvolvimento” (resolução 68/237), citando a necessidade de reforçar a cooperação nacional, regional e internacional em relação ao pleno aproveitamento dos direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos de pessoas afrodescendentes, bem como sua participação plena e igualitária em todos os aspectos da sociedade.

Esta data é celebrada nas escolas, instituições de ensino e na sociedade, com o intuito de reforçar a história dos afrodescendentes, a luta pela igualdade racial, a criminalização da escravidão moderna, uma prática considerada hedionda na contemporaneidade.

Infelizmente, a discriminação racial ainda predomina em diversas camadas da sociedade brasileira. Nós, da Comissão da Igualdade Racial, lembramos que o Dia da Abolição da Escravatura também serve como um mecanismo de conscientização e educação para ajudar a erradicar completamente qualquer tipo de preconceito racial, trabalhar temas relacionados à inclusão e ao direito dos vulneráveis, buscando efetivamente a igualdade entre as raças.