Conselheiro da OAB Paraná descreve alterações no Código de Processo Penal

Em artigo publicado na edição do dia 3 de julho (quinta-feira) do jornal Gazeta do Povo, o conselheiro estadual da OAB Paraná Juliano José Breda resume as principais mudanças no Código de Processo Penal. Confira o texto na íntegra: 

Alterações no Código de Processo Penal

Foram sancionados recentemente três projetos de lei que alteram dispositivos do Código de Processo Penal brasileiro. As mudanças passam a vigorar em até sessenta dias com o claro propósito de imprimir maior celeridade aos procedimentos criminais. A primeira e importante crítica a ser feita refere-se ao fato de as alterações procurarem atacar unicamente a fase jurisdicional do procedimento, mas simplesmente omitirem qualquer tratamento novo do inquérito policial, etapa fundamental no trabalho de reconstituição do crime, que continua sendo um instrumento de estrutura inquisitória e profundamente arcaico.

Determinadas mudanças atendem, em linhas gerais, a uma reivindicação coletiva, como é o caso da alteração do complexo procedimento do júri, com a concentração dos atos processuais e a exclusão da possibilidade de novo júri em caso de condenação superior a 20 anos. Promoveu-se uma sensível simplificação dos quesitos submetidos aos jurados, que, depois de indagados a respeito da materialidade do fato e da prova da autoria, simplesmente responderão: “O jurado absolve o acusado?”. Esse projeto teve o comando decisivo do Professor René Dotti.

A Lei 11.690/2008 trata, fundamentalmente, de matéria probatória, mantendo, em síntese, com sutis mudanças, a inclinação inquisitória do Código atual, cujo modelo de inspiração é a legislação italiana, da época fascista de Mussolini, em que se incentiva a atuação do juiz na colheita de provas, ao contrário do sistema acusatório, de maior garantia, em que a responsabilidade probatória é outorgada exclusivamente às partes.

O art. 157 reproduz o comando constitucional (art. 5º, LVI, CF – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos), mas seus parágrafos, no entanto, trazem as maiores novidades da lei, relativizando a regra constitucional.

O § 1º do art. 157, em homenagem à conhecida teoria dos “frutos da árvore envenenada”, proclama a inadmissibilidade das provas ilícitas por derivação, excepcionando duas situações: “quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras”.

Na recente Conferência Estadual dos Advogados, defendi a inconstitucionalidade do § 1º do art. 157 da nova Lei, pela absoluta incompatibilidade com o inciso LVI do art. 5º da Constituição (são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos), ao admitir a utilização, em determinadas circunstâncias, de uma prova ilicitamente derivada.

As alterações introduzidas pela Lei 11.719/2008 imprimem nova conformação ao procedimento comum, apresentando-se, no entanto, em descompasso com a precária estrutura do Judiciário, sobretudo, no que diz respeito à Justiça Comum Estadual. Em nosso estado, é importante frisar, até hoje não se oferece aos cidadãos uma Defensoria Pública nos moldes definidos pela Constituição.

O § 1º art. 265, que prevê a possibilidade de adiamento da audiência na hipótese de impossibilidade do comparecimento justificado do advogado, não deve ser entendido como uma mera faculdade, mas verdadeira imposição, um dever do magistrado, em nome do princípio constitucional da ampla defesa. É direito do acusado ser assistido pelo advogado que escolher e se eventualmente o profissional, motivadamente, não pode participar do ato processual, o adiamento, desde que não comprometa a aplicação da lei penal, deve ser a solução adotada.

A consagração do princípio da identidade física do juiz (§ 2º do art. 399: o juiz que presidiu a instrução deverá proferir a sentença) exige uma estrutura funcional que, em princípio, o Judiciário não tem, em face da notória sobrecarga de trabalho, algo que, infelizmente, a lei não resolve, podendo agravar ainda mais a sensação de ineficácia do sistema criminal.

Além disso, não parece razoável exigir do magistrado, de acordo com o novo art. 403, o julgamento imediato da causa, após a oitiva de diversas testemunhas a respeito de um fato complexo, com intrincadas questões jurídicas. Esse açodamento judicial imposto pela lei pode, concomitantemente, atentar contra o direito de defesa e implicar na queda de qualidade da prestação jurisdicional. Em regra, o juiz deverá facultar às partes a apresentação de memoriais em cinco dias.

Importante, ainda, é a criação, pelo art. 397, do instituto da absolvição sumária se o juiz verificar, depois de apresentada a defesa prévia do acusado, a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato, a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade, que o fato narrado evidentemente não constitui crime ou extinta a punibilidade do agente.

O sucesso da reforma, cujo objetivo principal é tornar o processo penal mais célere, dependerá, ainda, da mudança do atual quadro de precariedade estrutural da Justiça Criminal de primeira instância e, sobretudo, da urgente alteração do inquérito policial, em busca de maior efetividade da investigação.

Juliano Breda é doutor em Direito, advogado criminal, conselheiro estadual da OAB/PR e secretário-adjunto do Grupo Brasileiro da Associação Internacional de Direito Penal.

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